Um mundo em rápidas mudanças e mais exigente em termos ambientais e sociais torna mais complexa a tarefa do próximo governo num setor vital para o desenvolvimento do Brasil
Com crescimento de 2,2%, a indústria puxou a expansão de 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro no segundo trimestre deste ano, na comparação com os três meses anteriores. Esse desempenho da economia brasileira foi celebrado pelo governo, que viu nele o fim dos problemas decorrentes da pandemia de covid-19 e a retomada do crescimento acelerado. Para o setor industrial poderia significar a recuperação gradual de seu papel impulsionador e transformador da economia que desempenhou no século passado, mas que vem perdendo há algumas décadas. A realidade, no entanto, como ocorre muitas vezes, é menos brilhante do que desejaríamos. E é essa a realidade que aguarda o futuro governo.
Mesmo que cresça 2,7% neste ano e se mantenha entre as dez maiores do mundo, a economia brasileira terá expansão menor do que a da economia mundial. E as projeções para 2023 são de desaceleração acentuada da atividade econômica. Quanto à indústria, o bom desempenho observado no primeiro semestre do ano, além de insuficiente para recolocá-la no lugar que ocupou no passado recente da economia brasileira, não está assegurado no futuro. Esse é o lado mais preocupante, e que merece atenção especial do governo que tomará posse em 1.º de janeiro de 2023.
A indústria de transformação continua tendo papel vital nas mudanças pelas quais passa o sistema produtivo, estimulando a geração e a disseminação de novas técnicas e novos métodos. Ela gera também empregos em geral mais bem remunerados do que os de outros setores e induz a melhoria dos sistemas de ensino na medida em que eleva o grau de exigência do preparo da mão de obra que ocupa.
Mesmo perdendo gradualmente sua participação no PIB à medida que os países crescem e se desenvolvem, com a expansão de outros segmentos, como de serviços, a indústria mantém seu papel modernizador. No Brasil, porém, o declínio da indústria em relação a outros setores começou antes de o País ter alcançado o desenvolvimento atingido por outras economias. E a queda se observa também em nível internacional.
O Brasil vem perdendo posição entre os maiores produtores industriais do mundo há quase três décadas. Na última classificação feita pela Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial (Unido), a indústria brasileira ficou em 15.º lugar, respondendo por 1,28% da produção mundial em 2021. Em 1996, respondia por 2,55%.
Os últimos anos têm sido caracterizados por mudanças profundas nos processos de produção e comercialização, com a chamada quarta revolução industrial. A automação que marcou a fase anterior continua importante, mas agora está acompanhada de outros elementos, como robótica, inteligência artificial, interconexão, novas formas de organização da produção e novas formas de negócio.
O impacto sobre o trabalho está sendo notável. A redução das tarefas repetitivas e manuais está exigindo crescentemente trabalhadores multifuncionais e com conhecimento técnico diversificado. E surgem também novas especializações profissionais. Tudo isso ocorre num mundo em que as exigências quanto a questões como meio ambiente, impactos sociais e governança se intensificam. Energia sustentável é um dos símbolos desse novo modelo de produção.
É preciso, porém, que o presidente eleito comece a dedicar atenção a essas questões com presteza.
Reforma tributária que simplifique e estimule a atividade produtiva; investimentos em inovação, ciência e tecnologia; capacitação de mão de obra; eficiência energética com respeito ao meio ambiente; provimento de infraestrutura adequada de transporte e logística; aperfeiçoamento da legislação trabalhista onde necessário, mas sem ferir direitos, estão entre os temas frequentemente citados por dirigentes da indústria como prioritários. Eles compõem um roteiro que o futuro governo terá de entender se estiver preocupado com o futuro da indústria e da economia brasileira.
Fonte: Estadão (07/10/2022)