Independente de partidos políticos, os governos sempre usaram os recursos dos trabalhadores em projetos de seus interesses, seja em grandes obras ou para beneficiar grupos. No final, isto significa que o trabalhador brasileiro sempre trabalhou muito para satisfazer os privilégios de poucos. Parte do dinheiro descontado dos salários dos trabalhadores, em forma de impostos ou taxas, são destinados ao PIS/Pasep (Programa de Integração Social/ Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público), que gera a receita do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), ao FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) e à Previdência Social. O governo baixa medidas e retira recursos desses fundos para serem usados em seus projetos. Nesta entrevista, Sergio Luiz Leite, representante da Força Sindical no Conselho Deliberativo do Codefat (Fundo de Amparo ao Trabalhador) fala sobre os desafios que o Fundo e o trabalhador enfrentam, embora o dinheiro do FAT seja da classe trabalhadora.
Força Sindical – Qual a composição da receita do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador)?
Sergio Luiz Leite – Importante começar exatamente com esta visão: a origem das receitas do FAT. O grande orçamento do FAT vem por meio do PIS, da iniciativa privada, e do Pasep, do segmento público, que é uma porcentagem que incide sobre a folha de pagamento. Dessa porcentagem que incide na folha de pagamento há exceções. Por outro lado, para 2019 o governo estima em zero as receitas oriundas do Imposto Sindical, que rendia cerca de R$ 500 milhões por ano.
Quais são elas?
A primeira exceção trata das empresas, comércios e serviços que estão enquadrados no Simples fiscal. Estas estão isentas de fazer o recolhimento para o PIS/Pasep. Então, já é um grupo de empresários que não precisa pagar. No entanto, os funcionários dessas empresas (de forma correta) têm direito ao abono e ao seguro-desemprego, benefícios financiados pelo PIS-Pasep. Na verdade, quando se dá algum tipo de desoneração do caso do Simples fiscal, precisava ficar claro que o Tesouro Nacional cobriria a quantia paga aos trabalhadores na forma de seguro-desemprego e abono. A segunda exceção, não menos importante, é com a reforma trabalhista, que criou o trabalho intermitente, a possibilidade de ampliar a terceirização reduzindo a massa salarial. Já para o autônomo exclusivo não há contribuição para o PIS. Consequentemente, a contribuição para o FAT diminuiria. E, não menos importante, o desemprego de 13 milhões de pessoas, que deixam de contribuir para o Fundo de Amparo ao Trabalhador. Este é o primeiro gargalo para o qual temos de buscar solução. Como é que se resolve as receitas do FAT.
Que diminuíram muito enquanto o desemprego aumentou muito, não é?
Não tenho dúvida. O desemprego aumentou e a reforma trabalhista provoca um agravamento nessa arrecadação. Então, acho que receita do FAT, o combate ao desemprego e o combate à informalidade não podem caminhar separados quando buscar-se uma solução para o FAT.
Existem outras questões?
Temos outro conjunto de questões que precisamos resolver no FAT, como por exemplo a rotatividade de mão de obra no Brasil, que é de 46%. Quero lembrar que, quando o Brasil estava gerando 1, 5 milhão ou 2 milhões de empregos por ano, não diminuiu o pagamento de seguro-desemprego devido à rotatividade de mão de obra. As pessoas saíam de um trabalho, buscavam outra vaga, recebiam o seguro-desemprego. Naquela época, de pleno emprego, o Brasil chegou a quase 3,5 milhões de pessoas desempregadas. Ou seja: o seguro-desemprego não diminuiu por causa da rotatividade de mão de obra. Precisamos combatê-la regulamentando um artigo da Constituição Federal, que depende de lei ordinária para isto, que é beneficiar empresas, comércios e serviços da iniciativa privada que tenham um índice de rotatividade menor. Entendemos que elas deveriam até pagar menos e, por outro lado, empresas com rotatividade maior pagariam mais. Aí a gente criaria um incentivo para a empresa diminuir a rotatividade da mão de obra. Ficando mais tempo na empresa, o trabalhador não precisaria acessar o sistema de seguro-desemprego.
Tem outro problema do FAT que é a destinação do dinheiro: 30% para a DRU (Desvinculação das Receitas da União) e 40% para o BNDES( Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).
Fica muito pouco para ir para o bolso do trabalhador, embora o dinheiro seja dele, não é?
Exatamente. A DRU existe desde 1994. É quase que a existência toda do FAT. O dinheiro do trabalhador aparece ali e o governo fica doidinho para pegar e utilizá-lo a custo barato. Só para que se tenha uma ideia, a DRU já retirou do orçamento do FAT, de 1994 até agosto de 2018, 248,2 bilhões de reais. O patrimônio do FAT, que é constituído também dos 40% de tudo o que é arrecadado do FAT, vai para o BNDES, que tem bons programas de incentivo à geração de empregos, à ampliação de negócios, capital de giro para rodar a economia, mas esse patrimônio já está projetado para 327 bilhões de reais para 2019. Então estamos falando aqui de quase 600 bilhões de reais, entre a DRU que foi retirada, mais o patrimônio do FAT. Estamos falando sobre mais de meio trilhão de reais e aí é difícil para nós, trabalhadores, assumirmos que o FAT é deficitário. Existe o recurso, uma forma de aplicação dele mas, logicamente, a gente sempre busca corrigir que o FAT tem um problema de conta corrente porque, se o governo devolvesse a DRU, se aquele patrimônio do FAT estivesse na conta de utilização do dia a dia, certamente não teríamos problema nenhum com o FAT.
O que pode ser feito?
Falei da rotatividade, teríamos de resolver o que fazer com o Simples fiscal, qual será a fonte de custeio para o pagamento dos trabalhadores dessas empresas? Acabar com a DRU? Aplicar recursos no sistema público de emprego, que faz a intermediação da mão de obra? Todos trabalhadores que recebessem o seguro-desemprego deveriam passar pela qualificação profissional. A melhor forma de se resolver isto é arrumar emprego mais rápido para esses trabalhadores. Ainda que a economia esteja reagindo lentamente, a intermediação da mão de obra seria muito importante, inclusive para fiscalizar o trabalhador que está recebendo o seguro-desemprego. Se ele tiver uma oportunidade igual ao emprego anterior, cabe ao sistema público encaminhá-lo a esse emprego e incentivá-lo a essa nova oportunidade.
Mas por que isto não acontece?
O governo trilha do lado totalmente inverso. Para organizar o sistema público de emprego no Brasil precisaríamos ter um bilhão de reais. O FAT fez uma proposta extremamente modesta para o governo de aplicar 154 milhões de reais. O governo, por outro lado, sugeriu 38,6 milhões de reais. Para as pessoas terem uma ideia, isto não paga o sistema público de emprego do município de São Paulo. Mas o próprio projeto de lei orçamentária não caminha para isto. Ele se restringe em pagar abono e seguro-desemprego tão somente.
Qual o orçamento para 2019?
O orçamento que o governo propôs para o FAT é de 81,3 bilhões de reais em 2019. Para 2019, a estimativa dos técnicos do FAT é que 23,6 milhões de pessoas terão direito ao abono salarial e 6,7 milhões ao seguro-desemprego, que representa quase 15% da força de trabalho no Brasil. Os que recebem o abono são 50% da força de trabalho. Serão gastos 19,1 bilhões de reais com o abono salarial e 40,6 bilhões de reais com o seguro-desemprego. O orçamento de 81,3 bilhões, no entanto, inclui ainda os 30% da DRU e 40% do BNDES.
Fonte: Imprensa da Força Sindical.
Foto: Jaélcio Santana.