Clipping – Mercado de trabalho aquecido puxa receita do FAT

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Fundo tem em 2024 crescimento de arrecadação de 16%, enquanto gasto aumenta apenas 12%

Por Edna Simão — De Brasília (14/04/2025)

Puxadas pelo bom desempenho da economia e pelo mercado de trabalho aquecido, as receitas do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) – que financia o seguro-desemprego e o abono salarial, entre outras políticas públicas – têm crescido num ritmo superior ao das despesas. Enquanto os gastos subiram 12% de 2023 para 2024, alcançado R$ 81,622 bilhões, as receitas tiveram alta de 16%, somando R$ 128,882 bilhões. Os dados constam no balanço do FAT referente ao ano fechado de 2024.

Esse movimento está diretamente ligado ao desempenho da economia. Do ano passado para cá, o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) impulsionou a arrecadações com o PIS/Pasep – contribuições que abastecem o FAT – e também a formalização do emprego. Na despesa, o impacto é percebido pela limitação da expansão por causa do aumento significativo das demissões a pedido, que não resultam em direito a seguro-desemprego. O fenômeno tem impacto positivo nos gastos com esse benefício.

“O mercado de trabalho está aquecido ainda, mesmo subindo pouquinho o desemprego para 6,8% [no trimestre encerrado em fevereiro]. Com certeza, a maior formalização e aumento dos pedidos de demissão pelos trabalhadores ajudam a aumentar a arrecadação e a ter uma alta menor do [gasto com] seguro-desemprego”, explicou o representante da Força Sindical no Conselho Deliberativo do FAT, Sérgio Luiz Leite.

A subsecretária de Estatísticas e Estudos do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Paula Montagner, acrescenta que o alto patamar das demissões voluntárias é resultado não só do crescimento econômico como também da mudança do comportamento dos trabalhadores, que cada vez mais buscam melhora da qualidade de vida por meio de aumento dos salários e benefícios.

Segundo levantamento do MTE feito a pedido do Valor, as demissões voluntárias vêm aumentando gradualmente nos últimos anos. Em fevereiro de 2000, representavam 25,18% do total de pedidos, saltando para 30,9% no respectivo mês em 2021, 33,24% em 2022, 34,39% em 2023, 35,6% em 2024 e 37,53% em 2025. Assim, em fevereiro deste ano, do número total de demissões (2,147 milhões), 806.014 foram desligamentos feitos a pedido. Na ocasião, houve uma geração líquida 431.995 postos formais de trabalho – a maior variação absoluta em cinco anos. Os números são da base de dados do Novo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged).

Os dados MTE mostram, ainda, que os pedidos de demissão cresceram de forma mais significativa a partir de 2024. Enquanto em 2023 a média dos desligamentos por contra própria foi de 616,9 mil por mês, no ano passado esse número saltou para 716,3 mil. Ainda é cedo para fazer a média deste ano, mas o número está em 812,5 mil pedidos de demissão a pedido, considerando os dois primeiros meses do ano. “No ano passado, tinha emprego crescendo e oportunidade de migrar de empresas menores para empresas maiores. Este ano a gente não sabe se isso vai se comportar da mesma forma. Estamos olhando isso com bastante carinho e cuidado porque o mercado está bastante forte, mas crescendo em contratos mais frágeis”, destacou a subsecretária do MTE.

Para o economista e relações institucionais da Polo Capital, Arnaldo Lima, que foi assessor especial do ministro do Planejamento e um dos elaboradores das medidas para aperfeiçoar as despesas do seguro-desemprego e abono entre 2014 e início de 2015, com a esperada desaceleração da economia e do mercado de trabalho, em decorrência de uma política monetária mais restritiva, é provável que as demissões voluntárias diminuam e as dispensas sem justa causa aumentem. “Ao mesmo tempo, o crescimento da arrecadação do PIS/Pasep tende a perder fôlego, o que poderá pressionar o resultado financeiro do FAT, diante do avanço das despesas com o seguro-desemprego”, informou.

Hélio Zylberstajn, professor sênior da Universidade de São Paulo (USP) e coordenador do boletim Salariômetro, também avalia que o ritmo de crescimento das receitas acima das despesas em 2024 foi reflexo da economia aquecida e do baixo índice de desemprego. “Está havendo uma escassez de mão de obra. As empresas estão disputando os trabalhadores. Então, muitos recebem ofertas para deixar o emprego que eles estão ocupando para mudar para outra empresa e poder ganhar mais”, explica. “Quando você tem um ambiente com muito desemprego e excesso de mão de obra, isso não ocorre”, completa Zylberstajn.

Ele afirma que esse movimento pode ser visto também no aumento do salário médio de entrada dos trabalhadores celetistas. Enquanto a média histórica do salário de admissão é de 91,7% do salário de desligamento, em fevereiro deste ano a relação era de 95,2%. O número também é calculado com base em dados do Caged, dividindo a média dos salários de demissão pela média dos salários de contratação.

Os trabalhadores celetistas que pedem demissão não têm direito ao seguro-desemprego. Por isso, o aumento dessa despesa em 11,8% entre 2023 e 2024 está ligado ao número de profissionais demitidos sem justa causa e também à política de valorização do salário mínimo, que tem feito o valor do seguro crescer acima da inflação. Os gastos com o abono crescem 12,3%, impulsionados pelo reajuste real do benefício, assim como pelo maior número de pessoas no mercado formal, já que o benefício é pago a quem recebe até dois salários mínimos por mês proporcionalmente aos meses trabalhados.

“A percepção é de que a maior parte do salário estão abaixo do que deveriam ser e achamos que pode ter uma negociação [trabalhadores e empregadores] um pouco melhor”, observa Paula Montagner, destacando que os reajustes mais expressivos de salários têm ocorridos para cargos gerenciais e não para a maioria.

Em 2024, o ministério fez uma pesquisa para tentar explicar o elevado número de demissão voluntárias e chegou à conclusão que, além da economia, muitos trabalhadores, especialmente o de menor renda, tentam trocar de emprego para melhor salário e, possivelmente, isso continuará acontecendo. A subsecretária informou que a pasta pretende fazer nova sondagem para saber se os trabalhadores que trocaram de emprego estão nas mesmas empresas ou se ainda continuam buscando novas oportunidades.

Apesar da alta de 12% das despesas cobertas pelo FAT em 2024, o fundo conseguiu que suas receitas cresçam em ritmo superior. As contribuições para o PIS/Pasep aumentaram 24% entre 2023 e 2024, devido ao aquecimento da economia, que levou a um maior faturamento por parte das empresas. Essas contribuições são a principal fonte de recurso do fundo.

Lima ressaltou que o descompasso entre receitas e despesas contribuiu, temporariamente, para o resultado positivo do fundo no ano passado, diferentemente de 2022 e 2023, quando o Tesouro Nacional precisou aportar recursos para cobrir o déficit do FAT.

“A arrecadação do PIS/Psaep está diretamente atrelada ao faturamento das empresas e ao nível de atividade econômica. Já a despesa com o seguro-desemprego tende a crescer de forma pró-cíclica à economia, mas com certa defasagem em relação às condições do mercado de trabalho. Isso ocorre porque, em um primeiro momento, o aumento da formalização amplia o número de trabalhadores elegíveis ao benefício, assim como o número de demissões voluntárias impulsionado por melhores oportunidades de emprego”, explicou Lima.

Fonte: Valor Econômico (14/04/2025).

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