Fundacentro e trabalhadores defendem VRT para benzeno

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Cancerígeno gera exposição ocupacional, que deve ser controlada

Fundacentro foi palco de um debate público para discutir a regulamentação do benzeno. A direção da instituição e os representantes dos trabalhadores defenderam a manutenção do termo Valor de Referência Tecnológico (VRT) com a atualização necessária dos números estabelecidos. O VRT é considerado uma conquista da  Comissão Nacional do Benzeno, que deve ser retomada. Também houve a defesa do conteúdo do Anexo 13 A, que trata sobre a substância, da NR 15 – Atividades e Operações Insalubres.

Para a pesquisadora aposentada da Fundacentro, Arline Arcuri, o objetivo do Anexo 13 A é fazer controle da exposição ocupacional ao benzeno, produto comprovadamente cancerígeno, e o uso do termo VRT é mais adequado porque Valor de Referência Tecnológico facilita o entendimento de que não há valor seguro. “O VRT deixa claro riscos para saúde, já o uso do termo limite passa ideia de valor que protege”.

Em sua avaliação, o conceito de VRT é mais claro e objetivo, de acordo com a normatização internacional, sem deixar de considerar a cultura brasileira e mais acessível aos trabalhadores que estão expostos. “Não adianta chamar de LEO [Limite de Exposição Ocupacional], o trabalhador não terá a consciência de que é um limite negociado. Isso tem que estar escrito”, explica. “Não existe limite seguro de exposição. É preciso controlar o ambiente e mudar procedimentos que levam à exposição dos trabalhadores”, completa.

No debate, o pesquisador da Fundacentro, Gilmar Trivelato, defendeu o uso do LEO. “Não existe risco zero para benzeno. Ele está no ambiente. Em qualquer processo de queima de combustão pode ter benzeno, qual o risco aceitável então? O que a sociedade definiu como tolerável e aceitável”, afirma.

Já o auditor-fiscal do Trabalho e coordenador do GTT Agentes Químicos, Carlos Eduardo Domingues, falou do processo de levar o Anexo 13A da NR 15 como Apêndice Benzeno da NR 9 – Avaliação e Controle das Exposições Ocupacionais a Agentes Físicos, Químicos e Biológicos. Essa norma trará uma proposta voltada para cancerígenos. Em sua avaliação, o LEO não é um limite de tolerância.

Conquista dos trabalhadores

Para os trabalhadores, o uso do termo limite de exposição oculta o risco e passa um sentido de limite de tolerância. É o que avalia Anderson Medeiros, da Federação Única dos Petroleiros. “Conceito de VRT reconhece permanente o risco da saúde, o problema foi não ter sido revisado desde 1995. Queremos manter o VRT com valor menor e manter o Anexo 13 A”, afirma. Para ele, trata-se de conquista dos trabalhadores e é inadmissível perder uma linha dele, que é fruto da luta dos trabalhadores.

Para a procuradora Ana Gabriela Oliveira de Paula, do Ministério Público do Trabalho, é compreensível a preocupação com a nomenclatura, o que faz diferença no campo jurídico. “Papel do MPT é garantir que não haja retrocesso”, aponta.

Medeiros também acha importante manter critério qualitativo. “Uso do critério quantitativo leva em consideração só que é medido, mas a maioria das exposições não são medidas”, explica.

Representando a CTB (Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil), o engenheiro de segurança Eduardo Martinho Rodrigues apresenta resultados de artigos. Um dos trabalhos aponta o maior índice de benzenismo entre trabalhadores homens, com menos de 40 anos, de indústrias petroquímicas, postos de gasolina e oficinas mecânicas.

“Casos de leucemia surgem e o Inamps publica em 1986 a Circular 297, com as alterações sanguíneas que caracterizam o benzenismo”, destaca Rodrigues em sua apresentação, mostrando como os trabalhadores se organizaram para lutar pelo direito à saúde.  

Entre os grupamentos ocupacionais potencialmente expostos ao benzeno, estão: químicos, assistentes de laboratórios, frentistas de postos de combustíveis, tapeceiros/estofadores e afins, trabalhadores do tratamento de couros e peles, trabalhadores da fabricação de calçados, operadores e mecânicos de máquinas e motores, engenheiros mecânicos, técnicos em engenharia mecânica, mecânicos de sistemas de refrigeração e climatização, mecânicos e reparadores de motores e máquinas, operadores de máquinas de lavar madeira e operadores de máquinas de costura.

Substância cancerígena

No mundo, houve 17 milhões de casos de câncer em 2018, causando a morte de 9,6 milhões de pessoas. “Estima-se para o ano de 2030 um aumento atingindo 22 milhões de indivíduos (casos novos) e com 13,2 milhões de mortes. Os maiores aumentos ocorrerão nos países da África, Ásia e América Latina”, afirma a pesquisadora. No Brasil, a estimativa de casos novos de câncer para 2023 a 2025 é de 704 mil.

“Não existe limite seguro a agentes carcinogênicos”, afirma a pesquisadora do Inca (Instituto Nacional do Câncer), Márcia Sarpa, ao falar sobre a exposição ocupacional ao benzeno. Essa substância tem vários mecanismos de ação independente da dose limiar, como estresse oxidativo, genotoxidade, alterações cromossômicas, imunossupressão, além de hematotoxicidade.

O benzeno é considerado carcinógeno para humanos pela Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (Iarc).   Essa classificação – Grupo 1 – mostra que existem evidências suficientes de carcinogenicidade tanto em seres humanos, quanto em animais experimentais. Há associações positivas com leucemia mieloide aguda, leucemia linfocítica crônica, leucemia mieloide crônica, linfoma não-Hodgkin, mieloma múltiplo e câncer de pulmão.

Márcia Sarpa também apresentou os resultados da pesquisa Avaliação dos efeitos tóxicos dos trabalhadores de postos de combustíveis do Rio de Janeiro, realizada pelo Inca e pela Fiocruz. O estudo avaliou 324 trabalhadores expostos ao benzeno na região Sul, em que os postos de combustíveis ficavam em locais abertos e arejados, e no Centro, onde ficavam entre prédios, e 218 trabalhadores não expostos, para fazer comparativos. Houve coleta de sangue de 543 trabalhadores e a realização de entrevistas.

Os trabalhadores expostos incluíam 214 frentistas, homens, com exposição por via inalatória e dérmica. Os demais 110 atuavam em lojas de conveniência, sendo a maioria, nesse caso, mulheres, com exposição por via inalatória. “Os trabalhadores expostos por via inalatória (lojas de conveniência) apresentaram, de modo geral, os mesmos efeitos genotóxicos, epigenéticos e imunotóxicos que os trabalhadores expostos pelas duas vias, inalatória e dérmica (frentistas)”, aponta a pesquisadora do Inca.

Os resultados mostraram alterações iniciais em diferentes parâmetros hematológicos e bioquímicos usados para avaliar condições de saúde. Trabalhadores dos postos de combustíveis apresentaram o dobro dos níveis de ácido trans-trans-mucônico urinário (t,t-MA), biomarcador do benzeno, do que os trabalhadores de escritório não expostos à substância (grupo controle). Os trabalhadores expostos do Centro tiveram valores mais elevados de t,t-MA dos que os da Zona Sul do Rio de Janeiro.

O grupo de frentista mostrou ter chance oito vezes maior de ter alterações genéticas, ou seja, dano ao DNA, do que o grupo controle. Já os trabalhadores das lojas de conveniência apresentaram chance 3,8 maior de ter esses danos no mesmo tipo de comparação.

Outros resultados observados na pesquisa podem ser vistos no vídeo do debate debate público.  “Este estudo mostrou a importância em se considerar as diferentes formas de exposição que os trabalhadores podem sofrer ao realizar um estudo de monitoramento biológico com populações expostas a agentes químicos durante a rotina de trabalho”, avalia Márcia Sarpa. “Não existem limites seguros de exposição a agentes mutagênicos e cancerígenos”, conclui a pesquisadora.

Fonte: Fundacentro.

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