Clipping – Mudanças no Departamento de Aids do Ministério da Saúde provocam apreensão entre ativistas

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O secretário de Vigilância em Saúde (SVS) do Ministério da Saúde, Wanderson Kleber de Oliveira, anunciou, na última quarta-feira (3 de abril), durante reunião com os coordenadores de Programas Estaduais e Municipais de IST, HIV/aids e Hepatites Virais, em Brasília, que a tuberculose e hanseníase serão incluídas no rol de agravos de responsabilidade do Departamento de IST, Aids e Hepatites Virais.

Na ocasião, o diretor do Departamento de Vigilância, Prevenção e Controle das IST, do HIV/Aids e das Hepatites ViraisGerson Pereira reforçou a proposta de territorialização no atendimento à saúde. “Definindo prioridades, iremos aos locais discutir as necessidades e induzir para que as ações possam estar nos estados e municípios”.

Denise Arakaki, diretora substituta do Departamento, defendeu a mudança na estrutura da secretaria, com a inclusão da tuberculose entre os objetivos do Departamento. Segundo ela, é possível melhorar a resposta à hanseníase e à tuberculose com o trabalho que já é feito com as ISTs.

No entanto, apesar de pontos otimistas, ativistas questionam algumas informações a respeito da mudança, como diluição do orçamento e territorialização das ações. Além disso, temem que a medida seja um retrocesso onde a aids perca sua visibilidade e as conquistas defendidas há anos por ativistas. Confira os depoimentos:

Vando Oliveira – Rede Nacional dePessoas Vivendo com HIV/Aids (RNP + – Ceará): “Além de gerar mais gastos no orçamento, é preciso entender que mesmo a tuberculose sendo uma das oportunistas que leva muitas pessoas com HIV a óbito, não é juntando tudo que teremos avanços. E o que a Hanseníase tem haver como outros agravos junto à aids? Isto apenas mostra o desmonte e o início do fim da politica de aids e do próprio departamento. O governo quer apenas deixar a aids em uma invisibilidade e sem qualquer responsabilidade com uma epidemia com quase um milhão de pessoas no Brasil. Retrocesso que considero o começo do fim.”

Heliana Moura, ativista vivendo com HIV/aids: “Nós pessoas vivendo com HIV, estamos acompanhando as decisões sem participarmos delas, lamentável. Lembrando que a resposta à aids no Brasil já foi referência pela participação efetiva dos atores envolvidos no enfrentamento da epidemia. Essa decisão unilateral sem chamar para debate todos os atores envolvidos nos deixam apreensivos. Vivemos um momento de redução de gastos e, acredito eu, essa junção visa enxugar recursos, dessa forma reduzindo os recursos da aids e das outras patologias. Sem recurso, se precariza a saúde, enfraquece as ações de vigilância, enfraquece a promoção à saúde e prevenção às doenças, e tende a acabar as ações de educação permanente. Precisamos voltar ao diálogo para que as decisões não nos afetem.”

Veriano Terto, Observatório Nacional de Política de Aids: “A gente pergunta se essa decisão foi discutida, se houve uma consulta às partes interessadas. Parece uma decisão unilateral que parece ignorar as instâncias constituídas na governança da aids, da sociedade civil, e dos estados. Afinal, é o que se espera de uma decisão democrática. A divisão territorial, no entanto é bem vinda, mas não tem dado certo, já que os estados e municípios tem compromissos muito fracos. Tivemos uma série de exemplos que não deram certo. A exemplo do Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e Amazonas. Além disso, como fica essa prestação de contas? Tem que ficar claro sobre qual o nível de autonomia de cada um desses programas e como fica a distribuição dos recursos.”

Moysés Toniolo, Rede Nacional de Pessoas Vivenco com HIV/Aids (RNP + – Bahia): “Certamente com isto outras estruturas do Departamento podem mudar, a exemplo da CAMS (Comitê de Articulação com.os Movimentos sociais), e até a própria CNAIDS (Comissão Nacional de IST/Aids e Hepatites Virais, que assessora o Ministro da Saúde), pois agora irá ser necessário um diálogo TRIPARTITE com as outras duas patologias que agregam ao escola da discussão. Certamente isto mexerá radicalmente no aspecto do diálogo social, e ele precisará ser remodelado, atualizado e otimizado debate das atuais lógicas de fechamento de outras estruturas do Controle Social. Ou seja, precisaremos defender estes espaços em sua readequação, pois não podemos prescindir de sua existência. Mas o aspecto mais necessário de ser discutido será no campo Orçamentário-financeiro, e da manutenção de lógicas de investimento que não pulverizem orçamentos já estabelecidos para cada patologia em específico, muito menos que junte tudo numa coisa só e se perca a lógica de podermos analisar, acompanhar em monitoramento e avaliação a execução de tudo que foi criado até então. É o aspecto do planejamento estratégico de metas específicas, e depois conjuntas, que precisamos ver garantidas, sem perdas ou composições generalizantes que coloquem todas numa coisa só. Acredito que deva ser marcado um momento com a sociedade civil de aids, de Hepatites, de Hanseníase e de Tuberculose para fazer a mesma apresentação de intenções, como acredito que isto deva ser também pautado no Conselho Nacional de Saúde, conforme nos foi afirmado pelo Secretário Wanderson Kléber, bem como com a presença dos antigos diretores de cada pasta específica envolvida, que agora trabalharão em conjunto.

Toni Reis, presidente da Aliança Nacional LGBTI+ : “Creio que os técnicos e técnicas do Departamento tem experiência muito grande, são muito eficientes e são uma referência para o mundo. Então, se for para melhorar os outros agravos, afinal temos o conhecimento dos últimos 29 anos, acredito que pode ser bom. Acho que temos que avalizar essa situação e fazer os devidos controles que a sociedade civil organizada. Que os movimentos participem sugerindo melhoras.”

José Araújo, Espaço de Prevenção e Atenção Humanizada (EPAH) : Mostra um fragilidade tremendamente política de fortalecer o Programa de Tuberculose no Brasil. E, quando colocada dentro do Departamento, essa incompetência de mostrar uma caminho para a tuberculose no Brasil acaba fragilizando a questão da aids. Lutamos sempre para ter a aids como ponto político e forte no sentido de visibilidade. Não posso aceitar que se pense somente que não vai mexer no dinheiro da aids. É questão política de visibilidade. Então quando colocam tuberculose e hanseníase dentro do Departamento é mais uma sopa de letrinhas que, na realidade, o resultado não vai dar em nada. Ao contrário. Vai fragilizar, fingir que fizeram algo com essas doenças, fragilizar o Departamento de Aids e gerar uma perda política de anos, de ativistas que já morreram e lutaram para ter visibilidade. Não é questão financeira, é política. A política pública de tuberculose é um fracasso. E eles não tem como criar uma política fortalecida de tuberculose. O Programa de Aids está fragilizado. Joga-se todos em uma mesma panela para ver o que vai dar. E, com certeza, o que vai dar não é saudável para a saúde pública do Brasil.

Fonte: Agência Aids.

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